Peça sonho

“Por que a humanidade sofre?” – pergunta Agnes ao seu pai, o Deus Indra, olhando para o planeta Terra.
Assim como Alice cai na toca do Coelho e vive uma aventura onírica no País das Maravilhas, Agnes cai no nosso planeta e experimenta todas as venturas e desventuras da vida humana.
O dramaturgo sueco August Strindberg apresenta a via-crúcis de Agnes de forma inusitada, semelhante a uma féerie, um espetáculo extremamente visual e sonoro, um conto de fadas moderno sobre o inferno da vida na Terra. Em 1901, Strindberg queria levar para a cena “a forma incoerente, mas aparentemente lógica do sonho. Tudo pode acontecer, tudo é possível e verossímil. Tempo e espaço não existem”.
A dramaturgia da Peça Sonho é uma adaptação do texto homônimo de Strindberg, e conta ainda com poemas do poeta chileno Raúl Zurita, citações de obras de William Shakespeare e Samuel Beckett, entre outros. A pergunta inicial de Agnes nos parece ser extremamente pertinente nos dias de hoje e faz coro a tantos/as autores/as e artistas em estado de alerta com a vida de todos os seres que habitam o planeta Terra, esmagados por uma voragem capitalista que nos quer sem sono e sem sonho.
Fragmentos
“Por que a humanidade sofre?” – pergunta Agnes ao pai, o Deus Indra, olhando para o planeta Terra, em pé sobre uma nuvem, no Prólogo de Peça Sonho (1901), obra do dramaturgo sueco August Strindberg (1848-1912). Strindberg não sintetizou ouro, uma antiga pulsão alquímica, mas se gabava de ter inventado “um gênero novo, fantástico e brilhante” – a peça-sonho. Strindberg queria levar para a cena, em suas próprias palavras, “a forma incoerente, mas aparentemente lógica do sonho. Tudo pode acontecer, tudo é possível e verossímil. Tempo e espaço não existem”.





Mas como representar um sonho na cena? Como representar no teatro a passagem da humanidade sobre o planeta Terra? Esses são alguns dos questionamentos de Strindberg fundamentais para a nossa montagem.

Em Peça Sonho, podemos identificar muito do que será feito no teatro do século XX por autores, como: Antonin Artaud, Bertolt Brecht, Samuel Beckett, Heiner Müller e o nosso Nelson Rodrigues. É um sonho de teatro que, de fato, reverbera ainda hoje, um teatro no qual não há fronteiras entre gêneros.
Nosso desejo se aproxima do sonho simbolista de fazer do teatro uma caixa de imagens e de sons.
No seu périplo sobre a Terra, Agnes perceberá que há um problema de tradução entre a língua humana e a língua dos deuses.
Strindberg é um desses dramaturgos incontornáveis do final do século XIX e virada para o início do século XX.
= Sonhos de Strindberg. Sonhos de teatro. Sonhos da Terra. Peçamos sonhos =
Strindberg escreveu mais de 50 peças de teatro. Ele teve uma rica produção dramatúrgica na qual se destacam peças como O Pai (1887), Senhorita Júlia (1888), A Dança da Morte (1901), Rumo a Damasco (1898), O Sonho (1901 – tradução portuguesa) e Sonata dos Espectros (1907). Sua obra dialoga com vários gêneros dramáticos: peças fantásticas, históricas, alegorias, dramas realistas-naturalistas, dramas de estação pré-expressionistas etc. Strindberg também tem escritos autobiográficos, ensaios, narrativas e críticas de arte. Pintou paisagens, fez experiências fotográficas, sabia muito sobre botânica e chegou a se dedicar à química para sintetizar a pedra filosofal. A própria trajetória artística
dele permite traçar relações/tensões entre o teatro, outras práticas artísticas e campos de conhecimento.
Peça Sonho “É como uma espécie de via-crúcis, o calvário de Jesus Cristo, mas desta vez protagonizado por uma deusa, Agnes. Ela descobre que a Terra é o verdadeiro inferno. O casamento, a desigualdade social e econômica, a destruição da natureza, o absurdo da existência… A nossa passagem pelo planeta Terra tem algo de pesadelo para Strindberg”, explica Vanessa Teixeira de Oliveira, uma das diretoras do espetáculo. “De certa maneira, o espetáculo mostra que, apesar de tudo, do estrume também nascem flores. Existe essa dualidade nas relações humanas”, acrescenta Larissa Elias, diretora e atriz do espetáculo